Durante muito tempo eu resisti à ideia de comprar um Kindle. Sempre fui uma leitora à moda antiga, com muitos livros de papel, alguns em edições antigas passadas de geração a geração da família, comprados em sebos ou mesmo emprestados de bibliotecas. Com um de meus livros favoritos, lido pela primeira vez aos dezessete anos, adquiri o hábito de conversar com o texto - e, consequentemente, com o autor e outros leitores que viessem a emprestar o volume - através de anotações nas margens ou notas adesivas coladas às páginas. A ideia de ler em uma tela, ao invés das páginas de papel, sempre me incomodou e soava como algo distópico, além de incomodar minha vista. Com o tempo, arquivos em pdf e outras formas de digitalização se provaram fortes aliados em relação a livros esgotados, livros muito caros ou mesmo quando a leitura deveria ser mais urgente. Ainda assim, continuei preferindo o papel, sempre - e continuo.
Este ano cheguei a um impasse: trabalhando com literatura inglesa, muitos textos importantes ainda não foram traduzidos para o português ou, muitas vezes, acabam perdendo muito de seu sentido com a tradução (rende uma discussão no futuro). A solução é importar livros, que acabam saindo muito mais caros do que seu custo real e demoram MUITO para chegar no Brasil. Para terem uma noção, comprei The Madwoman in the Attic, da Sandra M. Gilbert e da Susan Gubar, em agosto do ano passado e a previsão de retirada na loja era para o final de setembro. No início de outubro fui à livraria e nada. Final de novembro e nenhum sinal. Apenas no final de janeiro/início de fevereiro deste ano recebi um e-mail da livraria informando que - finalmente! - meu livro tinha chegado. Paguei cem reais em uma edição paperback que, mesmo sendo um livro grosso, custaria muito menos se eu tivesse comprado nos EUA em dólar.
Outro problema é que, para importar esses livros, eu dependeria ou da Livraria Cultura, ou da Amazon, e soubemos há alguns meses que ambas são empresas que praticam abusos contra seus funcionários. Desde que li sobre essas denúncias, tomei a decisão de não mais comprar dessas empresas. (Aliás, pessoal, se souberem de alguma empresa de importação de livros para o Brasil que tenha atitudes bacanas e transparentes tanto em relação a seus consumidores como a seus funcionários, me deem um salve por aqui!)
Desde que tomei essa decisão, opto por comprar meus livros - apesar que estou tentando diminuir o consumo - diretamente da editora através dos sites ou das feiras do livro. Aqui por SP temos a da UNESP em abril, a da EACH-USP em maio e a da USP em novembro, que dão descontos mínimos de 50%, além das feiras menores que acontecem nas universidades quando rolam eventos como semanas dos cursos etc. Outra opção são os livreiros menores, que não pertencem a esses grupos que têm uma livraria em cada shopping e, além de não serem bons empregadores, são péssimos pagadores para as editoras. Na feira da USP do final do ano passado, um vendedor comentou que, para as editoras, vale muito mais a pena receber metade do preço de capa por um livro nessas feiras do que tomar calote das grandes livrarias e ficar com as mãos abanando - procurem os textos sobre a crise do mercado editorial que circularam no ano passado. Por fim, sempre vale muito a pena vasculhar sebos tanto pelos preços como pela qualidade dos livros e pela descoberta de vários tesouros.
Não farei uma defesa das bibliotecas neste texto porque acredito que elas merecem um texto exclusivo aqui no blog eventualmente, mas vale lembrar que não precisamos comprar livros para sermos leitores. Inclusive, quase todos meus livros favoritos foram descobertos através de empréstimos em bibliotecas e muitos livros das minhas pesquisas, tanto de IC como de mestrado e, agora, de doutorado, estão acessíveis nas bibliotecas das minhas universidades. Evidentemente, esses são os livros com os quais dialogo apenas mentalmente, nada de escrever em livro que não é nosso, hein!
Enfim, há pouco mais de uma semana, me rendi ao Kindle. Sei que é um produto da Amazon e que acabei financiando, de alguma forma, o capetalista opressor por trás dessa empresa, mas foi uma medida que se mostrou necessária. Ler na tela de computador ou iPad é difícil porque o tipo de tela é diferente do Kindle, que é mais "suave" com nossos olhos. Digo isso porque uso óculos há uns 13 anos e leio muito, então vista cansada é minha especialidade e sempre tento encontrar alternativas para driblar esse problema. Além disso, todos os romances que trabalho no doutorado ou que têm relação com o que estudo já são de domínio público, então consigo baixar tudo do Project Gutemberg. Também tem muitos livros do Domínio Público, é possível passar PDFs para o dispositivo, então livros não faltam para compensar o precinho salgado do aparelho. Além disso, ele é bem leve e fácil de transportar, facilita bastante para ler deitada - alô, fãs de calhamaços, como eu!
Por fim, escolher ler em papel ou em uma tela - ou nos dois - vai do gosto e dos hábitos de cada um, o importante é refletir bem sobre os impactos que isso pode causar no mundo ao nosso redor. Quando eu dizia que preferia livros de papel, já ouvi muito defensor de Kindle falando que eu estava causando a derrubada das árvores - ah, tá, vou deixar de comprar um produto de longa duração que eu amo e que me enriquece enquanto ser humano e isso vai super preservar o meio ambiente, o capetalismo não vai continuar derrubando árvores com outras intenções (aliás, isso pode render outra discussão mais para a frente). Claro que ter comprado um produto da Amazon (mas não comprei do site deles, a consciência pesa um pouco menos) é algo que me deixa muito bolada, mas se eu fosse importar todos os romances das Brontës, Radcliffe, Gaskell, Burney, Edgeworth, etc., e tivesse que recorrer a essa empresa, acabaria gerando muito mais lucros para eles do que esse aparelhinho que me permite pegar tudo de graça (Project Gutenberg, te amo!). Então foi um ônus que me trará muito mais bônus e me tornará mais apta a poder difundir mais conhecimento através do meu próprio enriquecimento intelectual, seja aqui no blog, na minha pesquisa, na sala de aula ou nos projetos de leitura de que participo.
Não sei ser interativa em blogs porque sou acadêmica e straight to the point, mas vou deixar um gancho caso vocês queiram compartilhar seus próprios hábitos, preferências, experiências nos comentários aí embaixo: E aí, galera, como vocês preferem servidos seus livros??
P.S.: Apesar de ficar zoando com "capetalismo" e "capetalistas", tenho certeza de que o Capeta é um sujeito bem mais bacana que os porcos capitalistas, rs.
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